O chamado
blended learning crescerá após pandemia, diz especialista.
Com o
surgimento da pandemia da covid-19, da noite para o dia professores e
alunos tiveram que se acostumar e se reinventar na forma de aprender e de
ensinar: com aulas online e videoaulas, entre outras
ferramentas, os educadores se viram diante de novos desafios, aos quais
estavam pouco ou nada preparados.
Embora o
ensino a distância (EAD) já seja realidade para os adultos que fazem
cursos técnicos, graduação e pós-graduação de forma online, para crianças
e jovens a modalidade ainda está em crescimento, mesmo que não seja uma
novidade, explica o professor e autor de livros didáticos Ismael
Rocha.
“Há muito tempo, diversas escolas
praticam o ensino híbrido. A partir do momento em que utilizam
diferente plataformas de ensino e aprendizagem, estão trabalhando com o
ensino híbrido. Quando há uma excursão para visitar um museu, uma área de mata,
essas visitas representam ensino híbrido, que é algo que acontece na sala de
aula e fora dela”.
O que não
estava estruturado, diz Rocha, era o uso constante do online. “O
que nós não tínhamos antes da pandemia era o uso das ferramentas virtuais para
o trabalho do ensino híbrido, não tínhamos a construção do online, que
era muito pouco utilizado. Algumas escolas já tinham uma plataforma onde
os alunos podiam tirar exercícios, publicar alguma lista de coisas que tinham
feito, mas da maneira sistemática como estamos começando a
ver hoje e como teremos daqui para a frente é uma novidade – não o
ensino hibrido, mas o ensino a partir do uso de plataformas digitais, o ensino online”,
acrescenta.
Considerada tendência na área da
educação para o futuro, a mistura entre o ensino presencial e o online,
que prevê um mix entre a sala de aula convencional e conteúdos
produzidos com apoio de ferramentas de tecnologia, vai invadir mais
fortemente a vida do estudante no mundo pós-pandemia. Mas o formato exige muito
mais mudança dos professores do que dos estudantes, acredita Rocha, que também
é diretor do Institute of Technology and Education (Iteduc), organização
pioneira em capacitar professores de educação básica para o ensino online.
“É uma mudança de paradigma, que
vai levar professores e alunos a acreditarem que a plataforma digital é uma
ferramenta extremamente útil para o processo de ensino-aprendizagem,
principalmente porque a grande maioria dos jovens, desde as crianças, utiliza
as ferramentas digitais para o lazer. A relação com o digital para as crianças
e os jovens não é uma relação nova, já é presente.”
Nativos
digitais
Na visão do especialista, o
esforço está em transferir essa habilidade dos jovens para a área da educação.
“O trabalho do professor vai ser fazer a transposição, acreditando que essas
ferramentas podem trazer e facilitar o processo de ensino-aprendizagem,
vamos ter dados mais significativos, vamos saber quantos alunos estão
entrando na plataforma para fazer a tarefa, para cumprir as atividades. Vamos
gerar a possibilidade de trazer para esses alunos informações muito mais
criativas e envolventes, ou seja, muda muito e muda para melhor.”
A adoção do método exige uma
reorganização do tempo de sala de aula, junto com novo plano pedagógico. O
professor ganha um papel também de mentor, apto a impulsionar os alunos em
direção a uma postura crítica, acompanhando as questões individuais e dando
vazão ao que melhor funciona no aprendizado de cada estudante. E as diversas
plataformas digitais vêm para somar essa relação ensino-aprendizado.
“Temos inúmeras plataformas que
permitem esse tipo de interação. Desde as mais simples, que permitem que você
faça uma aula e um exercício online, até as mais sofisticadas. Essas
ferramentas ainda não são tão fáceis de serem trabalhadas, porque a grande
maioria dos professores não é nativa digital, o que gera certa
dificuldade para que o processo todo aconteça de maneira tranquila. Os
professores estavam acostumados a ensinar, agora eles terão que aprender
para ensinar. Certamente, os professores conseguirão dominar essas ferramentas
para colocá-las em prática e permitir que o ensino híbrido se torne cada vez
mais uma realidade.”
Ensino
híbrido
Também conhecido pelo termo em
inglês blended learning, o ensino híbrido se acentuou com o
advento da internet e nada mais é do que combinar diversas plataformas, como
filmes, rádio e televisão, por exemplo. “Quando eu peço que o aluno assista a
um filme e, na aula seguinte, tenho um debate sobre o filme, estamos
trabalhando com diferentes plataformas para o que o processo de ensino se dê de
forma mais intensa, e tudo isso veio de maneira mais forte com o advento da
internet”, afirma Rocha.
Segundo o professor, atualmente
quem não tem acesso à internet e a computadores pode ficar prejudicado, mas há
outras formas. “Os alunos que não têm acesso a essas plataformas ficam
prejudicados sim, mas temos experiências em alguns lugares do mundo, com
características socioeconômicas parecidas com as do Brasil, em que as aulas
foram dadas pelo rádio por meio de emissoras estatais, ou seja, fizeram aulas
permitindo que os alunos daquele país pudessem aprender. Se olharmos de uma
maneira muito reducionista, entendendo que o ensino híbrido só pode ser feito
por meio de internet com banda larga, não há dúvida de que realmente
há um prejuízo para aquelas crianças e jovens que não têm acesso.”
O ensino híbrido pode ser feito
por meio de formas bem conhecidas, lembra Ismael Rocha. “Nós temos
estações de TV e rádio estatais, temos a possibilidade de fazer a geração de
materiais escolares numa velocidade muito rápida. É muito mais uma decisão
política, para que o ensino híbrido possa fazer parte do dia a dia das escolas,
do que uma decisão de tecnologia. Um exemplo no Brasil é o famoso telecurso,
quando uma série de pessoas conseguiu seu diploma dos antigos primeiro e
segundo graus, acompanhando aulas todos os dias pela televisão. Elas não
tinham oportunidades de ter aulas presenciais”, diz.
Na opinião do professor, a
pandemia traz esse avanço para a educação. “Se tiver um programa de educação
que seja formatado de maneira que todos possam ter acesso à
informação, certamente nós teremos um ganho. A pandemia traz exatamente esse
desenho: a possibilidade de mudarmos definitivamente a realidade da educação no
Brasil. Para a educação não existem limites, existe sim a necessidade
de ter boa vontade, porque aprender é algo que o ser humano faz desde
quando nasce, desde os tempos das cavernas, por diferentes plataformas, nós
estamos só sistematizando isso.”
Educa
Week 2020
Nesta terça-feira (14) no
Educa Week, às 9h, Ismael Rocha e mais três especialistas vão falar sobre
o tema, em debate de utilidade pública online. O debate contará com
a participação de Mario Ghio, diretor-presidente do Somos Educação; Guilherme
Cintra, head de Tecnologia Educacional do Eleva Educação, e Ademar
Celedônio, diretor de Ensino e Inovações Educacionais da SAS plataforma de
educação.
A Educa Week 2020 vai até domingo
(19 de julho). No total, serão mais de 30 painéis com a participação de 70
especialistas, que vão debater o futuro da educação no Brasil e compartilhar
experiências de sucesso do ensino-aprendizagem durante a pandemia, entre
outras pautas do setor. Para acompanhar os debates, aberto ao público, basta
acessar o site do evento.
Edição: Graça Adjuto
Publicado em 14/07/2020 – 07:22 Por Ludmilla
Souza – Repórter da Agência Brasil – São Paulo