Produto consumido no país terá mais qualidade a partir de 3 de agosto.
O padrão da gasolina automotiva consumida no Brasil terá aumento de qualidade obrigatório em 3 de agosto deste ano. A partir das mudanças, os motoristas devem obter desempenho maior dos veículos, e a fiscalização terá mais facilidade de identificar adulterações. Mas a qualidade maior também pode ter impacto no preço.
A mudança se deve à Resolução nº 807/2020,
publicada pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis em
janeiro (ANP). O texto estabelece novos parâmetros para a destilação, a
octanagem e a massa específica da gasolina automotiva vendida no país.
Especialistas ouvidos pela Agência Brasil explicam o que cada
uma dessas mudanças significa e como os motoristas vão se beneficiar delas.
A partir de 3 de agosto, 100% da gasolina comprada pelas distribuidoras
precisarão atender às especificações. Essas empresas terão 60 dias para
vender os produtos que foram comprados antes e não atendem às exigências. Da
mesma forma, os postos de gasolina terão 90 dias, a partir de 3 de
agosto, para vender os produtos que receberam antes de as especificações
se tornarem obrigatórias.
A doutora em química e especialista em regulação da ANP Ednéia Caliman conta
que a mudança aproxima o padrão da gasolina no Brasil ao que é praticado na
União Europeia, que já havia sido acompanhado por países como a Argentina e o
Chile. Os parâmetros também ficarão mais parecidos com os usados nos Estados Unidos.
“A gasolina está sendo melhorada para que os motoristas não sintam
problemas com a qualidade, não sintam perda de potência, não sintam falhas de
partida, não observem problemas de falha de detonação. Não há necessidade de
nenhum ajuste nos veículos para o recebimento dessa gasolina. Muito pelo
contrário. Ela está vindo justamente para se adequar às novas tecnologias e
mesmo para um veículo antigo, não há nenhum problema”.
Ednéia Caliman explica ainda que as mudanças estão alinhadas aos atuais requisitos de consumo de combustível dos veículos e de níveis de emissões atmosféricas, considerando o cenário fases futuras do Programa de Controle de Emissões Veiculares (Proconve – Ibama) e do Programa Rota 2030 – Mobilidade e Logística, do governo federal.
Densidade
Uma das principais mudanças é o estabelecimento de um limite mínimo de massa
específica para a gasolina automotiva. A partir de agosto, a gasolina
vendida às distribuidoras precisará ter 715 quilos por metro cúbico.
Antes, os fornecedores só precisavam informar os valores desse parâmetro, e a
ausência de um limite mínimo fazia com que a gasolina vendida no Brasil fosse
menos densa que a de outros mercados.
A massa específica da gasolina está relacionada à sua densidade, e quanto
maior ela for, maior é a capacidade de um mesmo volume de combustível
gerar energia. A gasolina mais densa tem mais energia disponível para ser
convertida no momento da combustão, e isso fará com que os veículos sejam
capazes de circular mais com menos combustível. A redução do consumo poderá ser
de 4% a 6%, estimam os estudos que embasaram a mudança publicada pela ANP.
Outra novidade nas especificações é o estabelecimento de uma faixa com limite
máximo e mínimo de temperatura para uma evaporação de 50% da gasolina, parâmetro
que é chamado de destilação e mede a volatilidade do combustível. Antes, a ANP
regulava apenas o limite máximo. Edneia Caliman explica que um perfil adequado
de destilação gera melhora na qualidade da combustão em ponto morto, na
dirigibilidade, no tempo de resposta na partida a frio e no aquecimento
adequado. Esses ganhos favorecem a eficiência do motor, resume a especialista
da ANP.
Resistência à detonação
A terceira mudança mais relevante nas especificações é na medição da octanagem, que é importante para controlar a resistência da gasolina à detonação. Quando o combustível tem uma octanagem adequada, ele resiste mais à detonação, o que faz com que ela ocorra apenas no momento certo dentro do motor. Esse parâmetro evita um problema conhecido como batida de pino, uma ignição precoce que causa danos ao motor.
Antes da resolução publicada neste ano, só havia especificação prevista no país para a octanagem MON e o índice de octanagem (IAD), que é a média aritmética entre as octanagens MON e RON. A diferença entre as duas medições é que a octanagem MON mede a resistência à detonação em uma rotação mais alta, e a octanagem RON mede o mesmo parâmetro em rotações mais baixas. Edneia explica que a evolução do conhecimento sobre os combustíveis permitiu concluir que o controle da octanagem RON é mais relevante que o da MON, e por isso as novas especificações exigem um mínimo de octanagem RON, que é de 92 para a gasolina comum, e de 97 para a gasolina premium. A partir de janeiro de 2022, o limite mínimo para a gasolina comum subirá para 93.
Especialista em combustíveis da Petrobras, Rogério Gonçalves conta que a empresa começou a adaptar suas refinarias para atender às especificações desde a publicação da resolução e já está cumprindo as exigências que se tornarão obrigatórias em 3 de agosto. A estatal é a maior fornecedora do combustível no país, e Rogério afirma que, além de já atender à especificação que vai começar a vigorar este ano, a Petrobras se antecipou em relação à octanagem e já está produzindo a gasolina nos moldes do que será exigido para esse parâmetro em 2022.
Preço
Gonçalves avalia que as novas regras também ajudam no combate ao combustível adulterado. “Muitos fraudadores de combustível adicionam produtos muito leves à gasolina para ganhar volume, produtos baratos”, explica ele, que afirma que, com uma gasolina mais leve, essas fraudes eram mais difíceis de identificar. As especificações que exigem uma gasolina mais densa, por outro lado, tornarão esses crimes mais fáceis de flagrar.
A gasolina mais pesada e de melhor qualidade também é mais cara para ser produzida e tem maior valor no mercado internacional, que é usado como referência pela Petrobras para definir os preços de seus produtos. Em nota, a empresa afirma que “o ganho de rendimento compensa a diferença de preço da gasolina, porque o consumidor vai rodar mais quilômetros por litro”.
A Petrobras explica que o custo de produção é apenas um dos fatores que determina o custo final da gasolina, que também é influenciado pelas cotações do barril de petróleo e do câmbio e pelo custo com frete. “Esses fatores podem variar para cima ou para baixo e são mais influentes no preço do que o custo de formulação. Além disso, vale lembrar que a Petrobras é responsável por apenas 28% do preço final da gasolina nos postos de serviço. As demais parcelas são compostas por tributos, preço do etanol adicionado e margens das distribuidoras e revendedores”, diz a estatal.
O presidente da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de
Lubrificantes (Fecombustíveis), Paulo Miranda, também avalia que possíveis
adulterações na gasolina, com as novas especificações, vão ser mais fáceis de
ser identificadas. A federação, que representa mais de 40 mil postos
revendedores de combustíveis, diz acreditar que haverá aumento de preços.
“Trabalhamos com margens muito apertadas e nunca temos gordura para
absorver eventuais aumentos. Então, quando a refinaria sobe o preço, é um
efeito dominó”, afirma Miranda, que torce para que se confirme a previsão
de ganho de desempenho nos veículos. “Esperamos que seja verdade, porque
aumento de preço é sempre ruim para todo mundo”.
Edição: Graça Adjuto