País é o primeiro fora do Reino Unido a fazer parte das pesquisas.
O Brasil poderá ter prioridade no uso da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford contra a covid-19. A informação é da reitora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Soraya Smaili. A instituição irá participar, a partir das próximas semanas, da terceira fase de pesquisas da vacina inglesa, realizando testes em cerca de mil pessoas que vivem em São Paulo e atuam em atividades com exposição ao vírus.
O laboratório da universidade do Reino Unido é o que está mais adiantado na construção de uma vacina contra o novo coronavírus, que deverá estar pronta em até 12 meses. De acordo com Smaili, a participação do Brasil – o primeiro país fora do Reino Unido a fazer parte das pesquisas da vacina – coloca o país como “grande candidato” a usá-la, com prioridade, assim que a sua eficácia for comprovada.
“Existem algumas conversas nesse sentido [para o país poder ter prioridade no uso da vacina]. Nós estamos trabalhando para que sim. O fato de estarmos integrando e sermos o primeiro país fora do Reino Unido e também o primeiro laboratório no Brasil a realizar esses estudos – semelhantes a esses não há nenhum outro no Brasil – torna o país um grande candidato”, disse, em entrevista a Agência Brasil.
De acordo com a reitora da Unifesp, com acesso à “receita” da vacina, o Brasil terá capacidade de reproduzi-la em grande escala, a partir de laboratórios nacionais. “Tendo acesso à vacina, nós temos capacidade de produção em larga escala, por meio dos nossos laboratórios nacionais de fato, como o Instituto Butantan, e os laboratórios da Fiocruz, entre outros”.
Leia a seguir a entrevista com a reitora da Unifesp:
Agência Brasil: Qual será o papel da Unifesp no processo de
desenvolvimento da vacina de Oxford?
Soraya Smaili: A vacina foi iniciada e desenvolvida até esse
estágio em que ela está, lá na Universidade de Oxford. O papel da Unifesp é
integrar agora a fase 3 de testes, que é um estágio em que você aplica a vacina
em voluntários humanos. É uma fase já avançada do desenvolvimento, porque já
passou por laboratório, pelas células, já passou pelos animais, já passou pelas
outras fases clínicas. Agora está na fase pegar indivíduos voluntários que vão
receber a vacina e que serão acompanhados por alguns meses para poder verificar
se a vacina é eficaz, se ela consegue proteger contra o coronavírus.
Agência Brasil: Por que o país e a Unifesp foram escolhidos para
participar dessa fase de testes?
Soraya Smaili: Inicialmente é por conta da liderança da
doutora Lily Yin Weckx, que é a coordenadora do estudo no Brasil e é
coordenadora do laboratório do Centro de Referência em Imunização da Unifesp.
Esse centro tem conexões com diversos outros pesquisadores do Reino Unido e da
Europa. E também por conta da doutora Sue Ann Costa Clemens, chefe do Instituto
de Saúde Global da Universidade de Siena, e também pesquisadora do Centro de
Referência para Imunobiológicos Especiais da Unifesp. Por causa da experiência
que elas têm na área e dos estudos que já realizaram anteriormente, com
reputação muito boa internacional, o nosso laboratório aqui da Unifesp foi
indicado para executar essa fase do teste da vacina.
Agência Brasil: Como a participação brasileira pode agregar
conhecimento ao desenvolvimento científico local?
Soraya Smaili: Nós vamos aprender muito com esse processo.
Mas, além de tudo, vamos poder participar de um importante trabalho que vai,
provavelmente, se tudo continuar correndo bem, em alguns meses ter uma vacina
que poderá ser aplicada em toda a população contra a covid-19.
Agência Brasil: Ter participado dessa fase dará ao país alguma
prioridade para que a população seja vacinada?
Soraya Smaili: Sim, existem algumas conversas nesse sentido.
Nós estamos trabalhando para que [seja isso] sim. O fato de estarmos integrando
e sermos o primeiro país fora do Reino Unido e também o primeiro laboratório no
Brasil a realizar esses estudos, estudos semelhantes a esse não têm nenhum
outro no Brasil, torna o país um grande candidato. Essa vacina foi aprovada
pela Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária], que é uma agência que é
ligada ao Ministério da Saúde, tudo isso, dependendo dos resultados, e com o
andamento da pesquisa, dessa fase da pesquisa e dos testes, nós temos grande
chance de termos, sim, acesso à vacina. Tendo acesso, nós temos capacidade de
produção em larga escala, por meio dos nossos laboratórios nacionais de fato,
como o Instituto Butantan, os laboratórios da Fiocruz, entre outros.
Agência Brasil: Quais os prazos para o início e final da pesquisa no
Brasil?
Soraya Smaili: Os testes ainda não iniciaram. Isso deve
acontecer por volta da terceira semana de junho. Essa fase será a fase de
recrutamento. Em seguida, os testes desses voluntários selecionados. Depois, a
aplicação da vacina, e o seguimento por alguns meses, até doze meses, para que
os resultados possam ser conclusivos. Eu disse até 12 meses, porque a
perspectiva é que este período pode ser de doze meses ou talvez um pouco menos.
Agência Brasil: O que a senhora destacaria desse processo que agora
envolve o Brasil?
Soraya Smaili: A importância de a gente ter a ciência
brasileira, a universidade federal trabalhando para o desenvolvimento de uma
vacina, que está entre as primeiras vacinas, entre as mais promissoras das que
estão sendo estudadas no mundo todo. Estamos – a nossa universidade está se
somando a um esforço global, é uma universidade pública federal ligada ao
Ministério da Educação – nos juntando a um esforço mundial para a obtenção de
uma vacina que vai beneficiar milhões e milhões de pessoas. Estamos muito
orgulhosos, contentes, de termos em nosso país uma universidade que são tão bem
equipadas com profissionais tão capacitados, que é um patrimônio do povo brasileiro.
Isso certamente temos de salientar. A ciência brasileira é uma ciência de alta
qualidade e, por isso, foi escolhida a Unifesp, porque tem essa qualidade, dos
nossos pesquisadores. Estamos em um esforço coletivo para superamos esse
momento. A ciência brasileira também vai dar a sua contribuição e as suas
respostas.
Edição: Maria Claudia